Os problemas da Petrobras com a Justiça dos Estados Unidos estão longe de acabar. Além de uma ação de classe ("class action") que possivelmente resultará em uma indenização bilionária, a companhia é alvo de no mínimo outras três ações judiciais individuais ajuizadas por investidores, mostrou um levantamento feito pelo escritório americano Quinn Emanuel Urquhart & Sullivan para o Valor.
A expectativa é que outros sigam o exemplo, o que pode elevar substancialmente os gastos da estatal com as indenizações.
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O principal processo ainda é a ação de classe, que tem como investidor líder o fundo de pensão britânico Universities Superannuation Scheme (USS). O processo reuniu cinco das ações propostas inicialmente e representa acionistas que compraram recibos de ações da Petrobras negociados em Nova York (ADRs) ou títulos da dívida entre 22 de janeiro de 2010 e 19 de março deste ano.
O potencial da compensação que a Petrobras pode ser obrigada a pagar nessa ação é grande, pois poderão participar todos aqueles que fazem parte "da classe" - isto é, que compraram os ativos durante o período estabelecido.
Alguns dos investidores, porém, escolheram não participar da ação consolidada e decidiram entrar com ações individuais contra a companhia.
"Esses investidores ficaram de fora da ação consolidada porque não querem fechar um acordo para receber pouco na indenização. Eles buscam a recuperação das suas perdas, que acham que são maiores", afirma Michael Carlinsky, advogado do Quinn Emanuel Urquhart & Sullivan.
No dia 23 de março, foram ajuizadas três ações individuais contra a companhia. Uma delas veio de um grupo de fundos de investimentos dos países Noruega, Luxemburgo e Dinamarca que alega ter perdido entre US$ 222 milhões e US$ 267 milhões com ações da Petrobras.
Também ajuizaram ações semelhantes dois outros grupos de investidores. O primeiro, liderado por um fundo de pensão de funcionários de Nova York, mira também um grupo de bancos que atuou na subscrição de títulos da dívida da companhia, além de acusar executivos, como os ex-presidentes Graça Foster e José Sérgio Gabrielli. O outro processo é liderado pelo Delaware Statutory Trust e cita os ex-executivos da companhia como "partes independentes relevantes" para o processo, mas não são réus.
Segundo Carlinsky, a expectativa é que outras ações como essa sejam ajuizadas em breve. "As descobertas da Lava-Jato continuam sendo levadas ao público. Os investidores veem o que realmente aconteceu e a Petrobras precisa responder pelos danos causados", afirma.
Três escritórios de advocacia americanos informaram ao Valor que esperam ajuizar ações como essa. Um deles conta que seu cliente, que tem sede em Hong Kong, teve perdas de mais de US$ 200 milhões com ações da companhia.
De acordo com o Carlinsky, os processos ajuizados nos Estados Unidos buscam dezenas de bilhões de dólares em recuperação das perdas. Por isso, a expectativa é que a Petrobras chegue a um acordo financeiro na ação de classe, evitando assim ser obrigada pelo juiz a pagar uma quantia ainda maior. "Os investidores que arriscam ficar de fora [da ação consolidada] querem ganhar mais", afirma Carlinsky.
Como a estatal já tem endividamento elevado e deve fazer uma baixa contábil significativa dos ativos inflados por corrupção, o peso das indenizações pode ser considerável. Recentemente, a Standard & Poor's alertou que o pagamento de indenizações pode deteriorar ainda mais o fluxo de caixa da empresa. Em janeiro, a Fitch também tinha feito um alerta, lembrando que a capacidade de pagar da companhia é limitada por sua estrutura de capital enfraquecida.
O caso da Petrobras chama a atenção dos investidores americanos porque a fraude foi admitida por ex-executivos da empresa. "Temos argumentos muito fortes contra a companhia e muitos investidores dizem que perderam dinheiro", explica Carlinsky.
Não por acaso, as ações incluem fatos descobertos na operação Lava-Jato nas evidências dos crimes contra as leis do mercado de capitais cometidos. São citados documentos enviados às autoridades reguladoras de mercado, reportagens publicadas pela imprensa sobre as investigações, testemunhos de executivos, acordos de delação premiada e outras evidências submetidas pelas autoridades brasileiras.
Outras empresas citadas pela operação Lava-Jato também estão sujeitas a processos semelhantes. A empreiteira OAS, por exemplo, já é alvo de uma ação ajuizada pelo fundo de investimentos Huxley nos Estados Unidos, que comprou títulos da dívida da companhia.
"Vamos ver mais companhias envolvidas na investigação, as que pagaram propinas, inflaram contratos", afirmou Carlinsky. Para ele, se os investidores conseguirem demonstrar que a Justiça americana tem jurisdição sobre as empresas, os processos acontecerão. A venda de títulos da dívida nos Estados Unidos, como no caso da OAS, pode ser usada para comprovar a jurisdição.
Os esquemas de corrupção da Petrobras são usados também como evidência contra s empresa em um caso em Porto Rico, território dos Estados Unidos. Um grupo entrou com uma ação contra a empresa de energia Puerto Rico Electric Energy Autority (Prepa) e um grupo de empresas, que inclui a Petrobras, por formação de cartel e manipulação de preços de óleo combustível.
A Petrobras e outras petroleiras são acusadas de vender óleo combustível que não atendia às especificações de qualidade, por meio de laudos falsificados de laboratórios. O texto da ação diz que a Prepa aceitava o combustível em troca de comissões e propina.
A ação alega ainda que os esquemas de pagamento de propinas "não são estranhos" à Petrobras e destaca o envolvimento da companhia com a Lava-Jato.
Fonte: Valor Econômico/Camila Maia | De São Paulo