A crise global tem provocado uma reviravolta na indústria petroleira. No Brasil, gerou uma reconfiguração nas refinarias da Petrobrás. Pela primeira vez em uma década, uma unidade da Bahia lidera hoje a produção de combustíveis, assumindo posição antes ocupada por São Paulo. Isso acontece porque a Rlam, instalada no município de São Francisco do Conde (BA), é a mais capacitada para fabricar os derivados de consumo marítimo que têm sustentado a estatal neste período de escassez - o bunker oil e correntes de óleo combustível de baixo teor de enxofre (bte).
Os dois são produzidos com a mesma matéria-prima, o óleo combustível, mas, ao contrário deste, são de alta qualidade, têm menos enxofre e, por isso, são menos poluentes. Desde janeiro, o bunker e o óleo combustível de baixo teor de enxofre são cobiçados pelo segmento internacional de navios, que foi obrigado a se adequar a uma nova exigência internacional de consumo de combustíveis menos prejudiciais ao meio ambiente.
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Com isso, a exportação de óleo combustível pela Petrobrás cresceu 11,5% na passagem do quarto trimestre do ano passado para o primeiro trimestre deste ano, ajudando a aumentar sua geração de caixa no período. Em maio, a empresa ainda bateu novo recorde de vendas externas - 1,1 milhão de toneladas de óleo combustível. A companhia não informa, porém, quanto desse volume é relativo a bunker e óleo combustível bte. Mas menciona a oportunidade gerada pela expansão desses mercados.
No Brasil, a Petrobrás tem facilidade de fabricar os dois produtos porque possui matéria-prima e parque de refino adequados a isso. Na Rlam, processa o petróleo das bacias de Campos e Santos, misturados a cargas menores do Rio Grande do Norte, Sergipe e Bahia, como informou a companhia, por meio de sua assessoria de imprensa.
Nos quatro primeiro meses deste ano, a refinaria baiana respondeu por 14,8% da fabricação total de derivados de petróleo da estatal, um crescimento de 2,9 pontos porcentuais em dois anos. Já o desempenho da Replan (SP), que por uma década foi a mais importante fabricante nacional e hoje ocupa a segunda colocação, com 14,4% do total, caiu 6 pontos porcentuais no mesmo período.
Os números são do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep), que utilizou em seu cálculo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) e da Petrobrás.
"Com o aumento da demanda pelo bunker e queda do consumo de derivados claros, a Rlam ganhou relevância na Petrobrás. A empresa possui um parque de refino diversificado que permite atender diferentes necessidades de mercado. Se tivesse um parque de refino mais concentrado regionalmente e na produção de determinados de derivados, perderia essa oportunidade", diz Rodrigo Leão, coordenador do Ineep.
Valor de mercado
Por conta da pandemia de covid-19, em março deste ano, a cotação do bunker caiu, mas retomou o fôlego neste mês. Nesta semana, teve a tonelada negociada a US$ 320, em Cingapura, principal comprador da Petrobrás. Essa cotação supera em 17% a do óleo diesel do Golfo do México, segundo a INTL FCStone. "A Petrobrás tomou uma decisão estratégica coerente com a mudança do mercado internacional, que abre espaço para exportação de produto de maior valor de mercado", diz o consultor de Petróleo e Gás da consultoria, Thadeu Silva.
A Rlam está na lista de privatizações da estatal. O processo de venda foi interrompido na crise, mas será retomado assim que o ambiente de negócios melhorar. A intenção da Petrobrás é manter com ela apenas as refinarias da região Sudeste.
Não acredito que a Petrobrás vai rever seu programa de venda de ativos. Não vejo um objetivo de valorização da cadeia de atividades por meio das refinarias. O programa de vendas é uma decisão para focar investimentos em E&P", avalia Luciano Losekann, especialista em Petróleo e Gás Natural e professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Questionada sobre sua estratégia no segmento de refino diante das recentes mudanças no mercado, a Petrobrás optou por não se posicionar.
Fonte: Estadão