A crise enfrentada pela Petrobras está reverberando mundo afora. Também pudera. Com uma base de acionistas extensa e pulverizada e dada sua relevância global, a empresa está no foco das atenções dos mais variados públicos. E desta vez foi um representante do meio acadêmico que teceu fortes críticas à situação da companhia, mesmo sem mencionar os episódios de corrupção.
Em texto extenso publicado em seu blog na terça-feira, o indiano Aswath Damodaran, professor de finanças corporativas da Stern School of Business, na Universidade de New York, fez uma espécie de retrospectiva da história da Petrobras, colocando os interesses centrais do governo desde a abertura de capital, com uma ingerência política que vem marcando as diferentes fases da empresa.
O acadêmico endureceu o tom principalmente em relação à destruição de valor de mercado da companhia, com a perda de US$ 160 bilhões desde o pico em 2010 (próximo de US$ 244 bilhões), e antes mesmo da queda do petróleo, que reforçou a tendência nos últimos meses.
"Colocado em termos brutalmente diretos, se você recebeu um negócio valioso e com o objetivo perverso de destruí-lo completa e rapidamente, você deve replicar o que a Petrobras tem feito em cinco etapas", assinala Damodaran, que descreve um roteiro da "tempestade perfeita para a destruição de valor".
"Invista primeiro, preocupe-se com retornos mais tarde (talvez nunca)" é o primeiro passo citado. Para ilustrá-lo, o guru das finanças corporativas aponta que, de 2009 a 2014, a Petrobras intensificou as despesas de capital e custos de exploração a mais de 35% das receitas, enquanto o retorno sobre o capital caiu para 5%, mesmo com o barril de petróleo cotado a cerca de US$ 100,00 na maior parte do período.
"Cresça, baby, cresça, e a rentabilidade que se dane." Essa foi a segunda etapa vivida pela estatal, caracterizada pelo professor como um crescimento disfuncional, com as receitas saltando de 1997 para 2014, em meio à queda drástica das margens de lucro. E o governo contribuiu para esse movimento, segundo ele, diante das pressões para a Petrobras vender gasolina a preços subsidiados no Brasil.
"Pague dividendos como uma empresa de serviços públicos (mesmo que você não seja uma)" responde pelo terceiro passo do processo, conforme o indiano. Em meio ao histórico da petroleira em pagar fartos dividendos aos acionistas, Damodaran diz que as ações preferenciais vieram com exigência de pagamento de dividendos onerosos, quando há uma ambição de crescimento por parte de uma empresa.
"Tome dinheiro emprestado para cobrir o déficit de caixa" é a quarta etapa descrita. A crítica do professor reside na dependência de contratação de dívidas pela Petrobras para se financiar, o que a levou a ter um endividamento total de US$ 135 bilhões ao fim do ano passado, acima de qualquer outra petroleira no mundo.
"Destrua valor (missão cumprida)", afirma o acadêmico, no passo final. Ao investir e crescer muito sem prestar atenção à rentabilidade, pagar dividendos com os quais você não pode arcar e tomar emprestado mais recursos do que deveria, foi criada a tempestade perfeita para a destruição de valor da companhia.
"A forma como a Petrobras tem sido gerida desafia o senso comum e os princípios básicos de finanças corporativas, de forma que, se eu fosse um adepto da teoria da conspiração, estaria praticamente pronto para comprar a ideia de que isso tudo é parte de um plano diabólico criado por gênios do mal para destruir a empresa", afirma. "Aprendi, contudo, por meio de uma dura vivência, que não se deve atribuir à maldade o que pode ser explicado por ganância, abuso de poder e sistemas ruins de incentivos."
Acompanhando à substituição de Graça Foster por Aldemir Bendine na presidência da Petrobras, o acadêmico, que não quis tecer comentários sobre o novo executivo por não conhecê-lo, deu sugestões sobre o que ele pode fazer nas próximas semanas.
São elas: contratar um diretor de operações que conheça o negócio petroleiro e delegar responsabilidades operacionais para ele; demitir qualquer pessoa na cúpula da gestão que tenha qualquer conexão política; alinhar-se aos conselheiros que representam os acionistas minoritários e defender um conselho mais independente e transparente; recusar-se a vender combustível subsidiado; fazer pressão para haver apenas uma classe de ações com direitos iguais de voto e cortar os dividendos a zero; tirar os investimentos em exploração do piloto automático e reduzir o foco no crescimento para o bem dele; e começar a pagar suas dívidas.
O pior que poderá acontecer, prossegue Damodaran, será a demissão de Bendine, mas, se ela ocorrer, o acadêmico avalia que o executivo poderá usá-la como um "distintivo de honra", uma vez que sua reputação será reforçada e ele vai sair da situação tido como herói. Se prosseguir com a empresa sem fazer mudanças, Damodaran assinala que não só Bendine vai enfrentar o mesmo destino de Graça Foster, como vai presidir a destruição final do que um dia foi a "joia da coroa do Brasil".
(Fonte: Valor Econômico/Beatriz Cutait | São Paulo)
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