A demanda por aço no mercado brasileiro enfrenta seu momento mais crítico - as vendas no mês passado, pressionadas pela crise econômica do país, tiveram uma retração de 18%, de acordo com números preliminares do Instituto Aço Brasil que deverão ser publicados hoje. O índice é médio, o segmento de aços longos, ligado às atividade de construção civil e obras de infraestrutura, apresentou um recuo ainda maior: superou a casa dos 23% no volume vendido.
A situação do setor levou à paralisação de dezenas de unidades operacionais - de altos-fornos a unidades de laminação e até minas de ferro - e a demissão de 22 mil pessoas. O consumo de aço no país, ao longo do ano, foi se deteriorando mês a mês, fruto da retração de demanda por parte dos principais consumidores: indústria automotiva, construção civil, bens de capital e bens eletrodomésticos. Juntos, eles respondem por 87% do total consumido.
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Com o agravamento da crise, há pouco mais de uma semana o grupo Gerdau demitiu 120 pessoas da sua força de trabalho na Bahia, onde paralisou uma usina de aço longo da companhia. Neste mês, a Usiminas começou a desligar suas coquerias na unidade de Cubatão (SP) e o desligamento de funcionários da usina, dentro de seu plano de parar toda a produção de aço bruto da antiga Cosipa até o fim de janeiro. A previsão é desligar todas as unidades, com demissões de quatro mil pessoas diretas e indiretas, mantendo em operação no local só atividades de laminação.
A Cia. Siderúrgica Nacional (CSN), conforme informações obtidas pelo Valor, deve anunciar nos próximos dias se fará, a partir de janeiro, uma operação de abafamento do alto-forno 2 da usina de Volta Redonda (RJ), pelo prazo mínimo de um ano, ou só uma paralisação por três meses e aproveitar para realizar manutenção das instalações. Janeiro a março é o período mais crítico do mercado de aço no país. Em 2016, com a crise política do país, pode se agravar.
Se optar pelo abafamento, que abrange a paralisação paralela de unidades de coqueria, sinterização e até aciaria, a empresa pode ter de cortar pelo menos 30% da força de trabalho direta e indireta, que atualmente é de mais de 10 mil pessoas. Além disso, a CSN deverá rever uma série de contratos com seus fornecedores de materiais, insumos e serviços.
O alto-forno 2 responde por 30% da produção de aço da CSN, cuja capacidade atinge 5,6 milhões de toneladas ao ano, mas já vem operando utilização pouco acima de 70%. Com a paralisação, ficaria operando só com de nº 3.
O setor não vê outra saída, no cenário atual, para amenizar a crise de vendas locais, a não ser uma medida emergencial para garantir o mercado interno que ainda resta às empresas. Essa é a avaliação de Marco Polo de Mello Lopes, presidente executivo do Instituto Aço Brasil, entidade que reúne as fabricantes de aço locais. Ele evitou falar sobre casos específicos das companhias do setor.
"É uma proteção de caráter emergencial", observou Lopes, explicando que o mundo siderúrgico vive um surto protecionista e o Brasil não pode ficar fora desse movimento, correndo o risco de ter seu já minguado mercado invadido por todos os lados. Ele informou que aço importado - apesar da queda que se verifica, fruto principalmente da retração do consumo local e muito pouco por causa do câmbio - já tem uma participação de mais de 15% no consumo aparente do país. Isso equivale a 3 milhões de toneladas.
Um grupo de trabalho no governo, envolvendo mais de um ministério, está avaliando o pleito de aumento nas alíquotas de importação de uma lista de produtos mais sensíveis de aço. Nasceu após uma visita de representantes da indústria à presidente Dilma Rousseff há 20 dias. Atualmente, a alíquota é de 14%.
O pleito gerou insatisfações na cadeia produtiva da indústria de transformação, principalmente de maquinas e equipamentos, autopeças e de bens de linha branca. E criou estremecimento na coalizão de setores que buscavam medidas conjuntas. "A agenda conjunta, com vários pontos, como câmbio, juto e cumulatividade de impostos, está mantida", disse Lopes.
Segundo ele, o que se busca é uma ação emergencial, de defesa comercial, para sobrevivência do setor no curto prazo. O setor alega que enfrenta um excesso global de 700 milhões de toneladas e mais 106 milhões devem entrar até 2017 na Índia, Oriente Médio e na China. O que dificulta também a exportação. "Temos sobra nas usinas que daria para exportar até 8 milhões de toneladas a mais".
Lopes disse que um estudo, a pedido do Aço Brasil apontou que há 146 medidas no mundo contra importações desleais, principalmente da China. E que outro estudo mostrou que tanto a redução de alíquota no Brasil para zero, alguns anos atrás ("lobby das montadoras de carros"), quanto seu aumento em 2012, não influenciou em baixa ou alta dos preços do aço. "Nossa indústria não é o vilão de uma história em que é vítima
Fonte: Valor Econômico/Ivo Ribeiro | De São Paulo