O projeto de criar uma grande petroleira privada brasileira, a OGX, que chegou a valer R$ 75 bilhões na bolsa, será sepultado entre hoje e amanhã com um pedido de recuperação judicial.
A companhia tornou-se operacional e financeiramente inviável, nas atuais condições. Desde sua criação, em 2007, investiu R$ 10 bilhões numa ampla campanha exploratória. O volume gasto com o sonho do empresário Eike Batista, porém, não é a principal razão para o fracasso financeiro desse projeto - que terminou por contaminar sua credibilidade e levar ao colapso do grupo EBX.
A raiz do problema da OGX foi o uso de dívida para financiar a fase mais arriscada do projeto - quando ainda não havia certeza das reservas adquiridas. No total, em seus seis anos de vida, a empresa levantou pouco menos US$ 9 bilhões com ações e dívida - US$ 1,3 bilhão em ações em 2007, US$ 3,7 bilhões na bolsa em junho de 2008 e US$ 3,6 bilhões com bônus, em 2010 e 2012.
A companhia tem hoje US$ 3,6 bilhões em dívidas com detentores de bônus emitidos no mercado internacional e ainda US$ 500 milhões junto a fornecedores.
No total, a OGX perfurou mais de 120 poços e chegou a ter, simultaneamente, dez sondas em operação. Tudo isso para concluir que, em boa parte dos casos, os campos adquiridos são inviáveis ou não tem o volume previsto de óleo.
A companhia perdeu quase R$ 2 bilhões só em Tubarão Azul e mais cerca de outros R$ 2 bilhões com Tubarão Areia, Tubarão Tigre e Tubarão Gato.
Com dívida elevada e sem previsão de lucros à altura, está em vias de pedir a recuperação judicial. Enquanto não o faz, acumula mais dívidas com fornecedores, pois alguns ainda prestam serviços à empresa.
Para que seu projeto de recuperação dê certo, a empresa ainda depende dos fornecedores para conectarem a plataforma OSX-3 ao campo de Tubarão Martelo - que teria condições de gerar receitas totais estimadas em R$ 11 bilhões.
A OGX, como grupo, possui quatro empresas, duas brasileiras e duas controladas austríacas. Todas devem entrar no processo.
Ainda não está definido o que ocorrerá com a empresa-irmã OSX, estaleiro que nasceu da demanda da OGX por plataformas e embarcações exploratórias.
As dívidas internacionais da OSX estão garantidas pelas plataformas fabricadas. Assim não haveria necessidade de negociação. Porém, é possível que a unidade brasileira sozinha, a unidade de construção naval (UCN), peça a recuperação judicial.
A OGX vive uma corrida para tentar finalizar a venda de sua participação de 67% na OGX Maranhão à Eneva (antiga MPX), que já detém os 33% restantes.
Nas apresentações que fez aos credores, a transação com a OGX Maranhão é estimada em US$ 400 milhões, incluindo as dívidas proporcionais. A discussão em andamento não geraria nenhum pagamento da Eneva à OGX no curto prazo. Entretanto, a petroleira iria a mercado descontar antecipadamente o dinheiro que virá da companhia agora gerida pelo grupo alemão E.ON.
Na segunda-feira à noite, conforme o Valor antecipou, a OGX anunciou o encerramento das negociações com os credores e divulgou a troca de propostas - o chamado "blow out", no jargão financeiro, que libera os credores do acordo de confidencialidade para negociar no mercado seus papéis.
As informações apontam o tamanho das disparidades entre o que cada grupo pretendia - a OGX, representada nas negociações pelos assessores Lazard e Blackstone, e os credores, representados pelo Rothschild.
Na semana passada, a OGX apresentou aos credores as novas projeções de resultado até 2020, com o barril do petróleo brent a US$ 105. Para 2014, estimava US$ 517 milhões de receita, que seguiria crescendo até o pico de US$ 1 bilhão em 2018 - a partir de então começa gradualmente a cair. O fluxo de caixa operacional se tornaria positivo em 2017, em US$ 200 milhões. A administração cortou a previsão de custos e despesas de 2014 a 2018 de US$ 700 milhões para US$ 450 milhões.
As propostas negociadas com credores tinham a premissa da recuperação judicial, para proteção do dinheiro novo
Os documentos não descrevem as conversas e ideias entre os grupos, só as propostas formais. No início, ainda na gestão de Luiz Eduardo Carneiro, a OGX apontava aos credores a necessidade de US$ 200 milhões em capital e mais US$ 300 milhões em dívida. A ideia era que os credores convertessem toda a dívida em ações, ficando com 57% do negócio. Eike e os acionistas atuais ficariam com 10% da empresa. A OSX teria 14%, por conta de créditos de US$ 1 bilhão, e restante seria dividido entre novos investidores e os fornecedores.
Todas as propostas da OGX tinham como premissa a recuperação judicial, para proteção do dinheiro novo, e a diluição de Eike e dos minoritários para 10% da companhia pós-acordo.
Os credores, por sua vez, exigiam que Eike colocasse US$ 500 milhões na companhia, no começo das conversas. Mais recentemente, aceitaram que o empresário não colocaria nada e sinalizaram com a possibilidade de aportar dinheiro novo. Mas a proposta dos chamados "bondholders" previa que Eike e os acionistas em bolsa ficassem com 5% da companhia saneada. Além disso, nem toda a dívida (US$ 4,1 bilhões) seria convertida em capital - US$ 1 bilhão seria trocado por uma dívida nova.
O ponto de maior atrito e sobre o qual não houve evolução foi a relação comercial com a OSX. Os credores queriam reduzir o valor da diária de aluguel da OSX-3 dos US$ 400 mil acordados para US$ 150 mil - por conta da subutilização com a baixa produção do campo.
Também queriam o direito de desfazer o contrato dentro de três anos e limitar as pendências da OSX com a OGX a US$ 500 milhões - metade do que a OGX afirma existir em dívidas.
Ontem à noite, a OSX anunciou a rescisão do contrato com a OGX pela plataforma OSX-1. O estaleiro diz que "buscará exercer seus direitos legais" na obtenção dos atrasados e verbas rescisórias previstas em contrato e na legislação. Além disso, sinaliza não concordar com os números divulgados pela OGX sobre tais pendências.
A OGX ainda busca um aporte de recursos. Após diversas modificações, a companhia afirma que necessita apenas de US$ 75 milhões no curto prazo. Os esforços por capital novo devem prosseguir dentro da recuperação judicial.
Fonte:Valor Econômico/Graziella Valenti | De São Paulo
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