Associação, que participou de reunião da Comissão de Especialistas em Transporte Marítimo do bloco regional, defende diálogo setorial e ações do governo federal para implementar proposta
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O diretor-executivo da Associação Brasileira de Cabotagem (Abac), Luis Fernando Resano, apresentou na última quinta-feira (15) a proposta de criação de um corredor verde do transporte marítimo entre os países do Mercosul, com uso de combustíveis menos poluentes, como biodiesel e, principalmente, etanol. A sugestão foi feita durante reunião da Comissão de Especialistas em Transporte Marítimo (CETM), que integra o Subgrupo de Trabalho nº 5 (SGT-5) do grupo de países da América do Sul, e que foi organizada pelo Ministério de Portos e Aeroportos (MPor).
Ele ressaltou à Portos e Navios que a proposta ainda é embrionária e deve ser formatada para ser apresentada na próxima reunião do grupo no primeiro semestre de 2026 no Paraguai, país que assumirá a presidência temporária do bloco, substituindo o Brasil. O objetivo, explicou, é criar critérios que sejam compatíveis com as exigências para descarbonização estipuladas pela Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla inglês) e que sejam economicamente viáveis para as empresas de navegação, principalmente as de cabotagem.
Para isso, a estratégia é procurar os setores que podem ser envolvidos no projeto de criar linhas de transporte marítimo mais sustentável, com menos emissões de gases do efeito estufa (GEE). Entre eles, Resano citou órgãos de governo, como o próprio MPor e o Ministério de Minas e Energia (MME), além de empresas que produzem biodiesel e a Petrobras, principal distribuidora de combustíveis do país.
Segundo Resano, entre os obstáculos a superar estão a produção insuficiente de biocombustível para atender à frota brasileira de navios mercantes, a falta de uma rede de distribuição que permita o abastecimento das embarcações nos portos e a necessidade de adaptação dos motores dos navios para receber etanol. São questões que ele definiu como prioritárias para que se possa pensar em ter um corredor verde no comércio marítimo no continente. A elas se junta a dificuldade de empenho de todos os países do Mercosul na busca de soluções comuns.
No caso da produção de biodiesel, ele adiantou que já estão sendo iniciadas conversas com produtores de soja e do combustível dela derivado para mostrar o potencial de mercado e as possibilidades de ganhos para quem investir no segmento. “Temos feito contatos com produtores de biodiesel para pedir atenção ao setor marítimo”, disse Resano.
O diretor-executivo da Abac garantiu que o aumento da produção do biodiesel não causaria nenhuma perda aos exportadores de soja porque o combustível é obtido pelo esmagamento do grão e que o farelo resultado pode ser aproveitado, e exportado, para ser usado como ração animal. “A produção do biodiesel não afeta a oferta de comida, como alegam os europeus, que não produzem soja e não querem concorrência”, garantiu.
Mas, mesmo com aumento da fabricação do produto menos poluente, será preciso superar um obstáculo que Resano considera ainda mais difícil: a distribuição por todo o país, em portos e demais pontos para abastecimento dos navios. Segundo ele, essa rede não existe hoje, o que, por enquanto, inviabiliza o uso do biodiesel pelas embarcações.
Na avaliação do diretor-executivo da Abac, a solução poderia vir da Petrobras, que já conta com rede própria e eficiente de distribuição de combustível e poderia usá-la para levar o biodiesel até os consumidores do setor marítimo. “Se a Petrobras assumir essa responsabilidade, há possibilidade de que o uso desse recurso se torne possível”, sugeriu.
Ele considera o etanol a melhor opção de combustível com baixa emissão de GEE, com a ressalva de que seu uso pelas embarcações exigirá adaptações nos motores e, consequentemente, aumento de custos e de preços do frete. Dessa forma, a alternativa só se tornaria viável com uma política de governo para garantir que os que investirem no combustível mais limpo não sejam prejudicados com a perda de cargas para outros modais.
Resano entende que, se o setor marítimo investir em motores mais sustentáveis e tiver que repassar custo para preços, pode perder clientes para outros modais, notadamente o rodoviário, muito mais poluente, se esse oferecer fretes mais baratos. “Quem escolhe o transportador é o dono da carga, e a maioria escolhe quem cobra menos pelo serviço”, afirmou.
Ele lembrou que o corredor verde poderia ser ainda uma forma de os transportadores marítimos escaparem de taxas que serão cobradas a partir de 2028 pela IMO, que exige a redução das emissões até chegar a zero em 2050. E explicou que quem usar o biodiesel ‘B40’ terá cobrança mais que quem usar o ‘B100’ e quem usar etanol poderá ficar isento, por ser o combustível que menos polui.
Por isso, a Abac cobra ações do governo para coordenar todo o processo, estabelecer metas de produção e de distribuição para que o corredor se torne viável sem onerar as empresas de navegação e, consequentemente, os donos das cargas e os consumidores finais. “O governo precisa agir para tornar o corredor verde realidade em benefício de todos, incluindo o meio ambiente”, defendeu Resano.
A Abac também é a favor que a questão seja tratada não só como política de governo, mas como política de Estado e que todos os órgão e empresas, inclusive estatais, sejam envolvidos nas discussões e na formatação da proposta para que possa ser apresentada na próxima reunião do Mercosul e seja transformada em realidade. “Espero que o Brasil esteja empenhado em criar um corredor verde no transporte marítimo no continente”, comentou Resano.
Ele disse acreditar que a Petrobras pode ter papel importante, principalmente na distribuição, mas também na possibilidade de investir na produção de combustíveis menos poluentes. Mesmo ressaltando que esse não é objetivo para qual foi criada, já que é uma petroleira, a empresa poderia contribuir e até, no futuro aumentar seus ganhos, inclusive com a exportação dos produtos, que serão cada vez mais demandados por empresas marítimas de todo o mundo para cumprir as metas de descarbonização impostas pela IMO.