Um estudo realizado pelo Instituto de Tecnologia da UFPA, através da Faculdade de Engenharia Naval, mostra que é tecnicamente viável a implantação, no Pará, da Base Naval da 2ª Esquadra da Marinha, megaempreendimento que mobilizará investimentos superiores a R$ 30 bilhões. O estudo, coordenado pelo professor Hito Braga de Moraes, coordenador do curso de graduação de Engenharia Naval da UFPA, teve caráter eminentemente técnico. O local de escolha, segundo concluiu o autor, tanto poderia ser o município de Chaves, no extremo norte do Marajó, quanto a ilha da Tijoca, no município de Curuçá, no sítio onde ficaria o porto do Espadarte.
O trabalho foi encomendado à UFPA pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea) e pelo Conselho Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), além do Movimento Pró-Base do Marajó - intensa mobilização popular desencadeada pelos municípios marajoaras com foco central na cidade de Chaves. O autor não incluiu no estudo a cidade de Belém como área de interesse, por considerar que o porto da capital, em face de severas restrições técnicas, já havia sido preliminarmente descartado pelo próprio comando da Marinha.
O professor Hito Braga aponta como objetivo do trabalho apresentar as possibilidades de implantação de uma nova Esquadra da Marinha na região amazônica e destaca que, para credenciar o Pará como alternativa para implantação da Base Naval, foram utilizados fundamentos técnicos e sociais. O estudo seria apresentado no dia 16 de agosto ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, na visita que ele faria a Belém para discutir o assunto. A viagem do ministro, porém, acabou cancelada à última hora, frustrando os paraenses que esperavam uma palavra oficial sobre a localização do futuro empreendimento, disputado também pelo governo do Maranhão.
O pesquisador da UFPA destaca, em primeiro lugar, que a intenção do seu trabalho não foi se contrapor ou mesmo criticar os estudos conduzidos pelo corpo técnico da Marinha do Brasil, que elegeram preliminarmente, segundo ele, o sítio da Ponta da Espera/Ilha do Medo, na baía de São Marcos, em São Luís do Maranhão. “O nosso propósito é oferecer uma nova visão sobre os pontos relevantes que levaram à preterição dos sítios paraenses”, acrescenta.
O professor Hito Braga lembra, em seu estudo, que o decreto presidencial que lançou, em 2008, as Diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa, já relacionava, entre diversos tópicos, a necessidade de implantação da esquadra para defender a Amazônia. “Sem desconsiderar a necessidade de defender as maiores concentrações demográficas e os maiores centros industriais do país, a Marinha deverá estar mais presente na região da foz do Amazonas e nas grandes bacias fluviais do Amazonas”, afirmava o documento, que defendia ainda o adensamento, nas áreas de fronteira, da presença de unidades das três Forças Armadas – Marinha, Exército e Aeronáutica.
Defesa estratégica da Amazônia no centro dos debates
A própria Estratégia Nacional de Defesa, de acordo com Hito Braga de Moraes – mestre e doutor em portos, hidrovias e engenharia naval –, confere especial prioridade para a região Amazônica, o que recomenda a implantação, aqui, da 2ª Esquadra. “A Amazônia representa um dos focos de maior interesse para a defesa. A defesa da Amazônia exige avanço de projeto de desenvolvimento sustentável e passa pelo trinômio monitoramento e controle, mobilidade
e presença”, afirma.
No mesmo documento, o Ministério da Defesa sustenta que o Brasil será vigilante na reafirmação incondicional de sua soberania sobre a Amazônia brasileira. A posição do governo, conforme observa o pesquisador, sinaliza claramente para o caráter estratégico da região. “O Brasil repu-
diará, pela prática de atos de desenvolvimento e de defesa, qualquer tentativa de tutela sobre as suas decisões a respeito de preservação, de desenvolvimento e de defesa da
Amazônia”, acrescenta.
No item que trata de ações para desenvolver, fortalecer a mobilidade e a capacidade logística, sobretudo na região amazônica, a Estratégia Nacional de Defesa reafirma a importância de se possuir estruturas de transporte e de comando e controle que possam operar em grande variedade de circunstâncias,
“inclusive sob as condições
extraordinárias impostas por um conflito armado”.
No tópico seguinte, ao definir a hierarquia dos objetivos estratégicos e táticos da Marinha do Brasil, declara que a presença da Marinha nas bacias fluviais será facilitada pela dedicação do país a um paradigma multimodal de transporte no qual estará contemplada a construção, entre outras, das hidrovias do Madeira, do Tocantins/Araguaia e do Tapajós/Teles Pires.
Com esse objetivo ficou estabelecido que a Marinha iniciaria os estudos e preparativos para estabelecer em lugar próprio, “o mais próximo possível da foz do rio Amazonas”, uma base de uso múltiplo, comparável, na abrangência e na densidade de seus meios, à Base Naval do Rio de Janeiro. A proximidade com a foz do Amazonas, apontada como pré-condição, recomendava naturalmente como localização adequada algum ponto no Pará ou no vizinho Estado do Amapá. Na disputa, porém, entraram Maranhão, Ceará e até Pernambuco. Hoje, já se tem como praticamente certo que a Base Naval vai mesmo para a capital maranhense.
Curuçá e Chaves são os mais viáveis aponta a UFPA
Preteridos no estudo conduzido pela Marinha, a Ponta do Espadarte, em Curuçá, e o município de Chaves, no Marajó, foram apresentados como alternativas, pelo estudo da UFPA, para possível reanálise por parte do Ministério da Defesa. Ao enumerar razões que disse considerar “significativas”, o professor Hito Braga de Moraes cita, como fatores capazes de interferir no poder decisório sobre a escolha locacional, a distância da área prioritária de defesa (a Amazônia), a distância de centros urbanos densamente povoados e as possíveis restrições de acesso marítimo.
No tocante à distância, por exemplo, ele observa que as duas alternativas locacionais do Pará atendem integralmente a essa premissa, pesando a favor de Chaves o fato de estar equidistante de
ambas as barras estuarinas. Tendo-se como referência a calha norte, Chaves dista apenas 87 quilômetros, contra 340 quilômetros do Espadarte e 853 quilômetros da Ilha do Medo, em São Luís. Em relação à calha sul, a Ponta do Espadarte guarda a menor distância (37 quilômetros), contra 216 quilômetros de Chaves e 536 quilômetros da Ilha do Medo. Note-se que no quesito distância - e tempo de viagem -, a alternativa maranhense seria a menos recomendável, na comparação com as duas hipóteses locacionais do Pará.
O pesquisador da UFPA rechaça também, como fator impeditivo, a questão das restrições de acesso marítimo. Em Chaves, por exemplo, verificam-se profundidades acima de 10 metros (no Espadarte, 25 metros), que são capazes de atender ao maior calado da frota da Marinha do Brasil, que é hoje de 8,60 metros. Até mesmo um banco de areia existente em frente à cidade, diminuindo a profundidade da lâmina d’água e permitindo o acesso somente pelos canais laterais, segundo Hito Braga, pode ser tomado como um elemento favorável, já que, em caso de ataque, ele fun-
cionaria como trincheira natural de proteção ao avanço de eventuais forças inimigas contra instalações nacionais de defesa.
Quanto à distância de centros urbanos densamente povoados, item que confere à Ilha do Medo um peso decisivo, em fase da complexa infraestrutura urbana e da logística já disponível em São Luís, o especialista faz ainda um enfoque contraditório. “Defender a Amazônia implica também desenvolvê-la. A implantação da nova esquadra na foz do rio Amazonas traria grande desenvolvimento a uma região historicamente condenada ao atraso e que não tem perspectiva, a curto prazo, de proporcionar a seus habitantes acesso a um nível de vida promissor”, finalizou Hito Braga.
(Fonte: Diário do Pará)
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