Depois da derrocada nos anos 80, a navegação doméstica volta a ser uma opção viável para as empresas que transportam grandes volumes e apostam na racionalização logística. A migração para o navio de cargas antes transportadas por caminhão está apoiada no tripé custo, eficiência ambiental e integridade da carga - que sofre menos avaria no mar do que nas estradas. Diante da ascensão de novos consumidores brasileiros, os desafios agora são aumentar a oferta de embarcações e melhorar a infraestrutura portuária.
"O potencial de usar cabotagem é enorme, depende da disponibilidade dos operadores em investir em mais linhas", afirma o diretor de logística do mercado interno da Brasil Foods, Darlan Carvalho. Hoje, a gigante de alimentos transporta em navio apenas 4% das 2,5 milhões de toneladas que movimenta no mercado interno anualmente. Se houvesse mais capacidade nas rotas marítimas, certamente esse índice aumentaria, diz Carvalho. Por outro lado, até pouco tempo os armadores argumentavam que não tinham como expandir os serviços sem a garantia de que os volumes viriam, num típico dilema do "segredo de Tostines".
Hoje, a charada parece ter sido solucionada. Companhias estrangeiras de navegação de longo curso criaram subsidiárias e empresas brasileiras entraram no negócio. A frota de navios porta-contêineres operacionais dedicados à cabotagem com frequência regular na costa é de 20 embarcações (oito da Aliança; sete da Log-In; três da Mercosul Line; e duas da Maestra, empresa recém-criada). E a maioria delas planeja ampliação para este ano. A Maestra estará com mais duas unidades neste semestre; a Aliança irá reativar dois navios que ficaram parados em 2009 e 2010, por conta dos efeitos da crise mundial; e a Log-In está tocando plano de R$ 1,3 bilhão para renovação da frota que prevê embarcações maiores para substituir as atuais. Duas delas chegam até setembro. Criada em 2007, a companhia verifica desde então um crescimento anual de 28% nos volumes. "Acreditamos que esse mercado tem um potencial de crescimento muito forte", diz o presidente da Log-In, Vital Jorge.
Estudo encomendado pela empresa aponta que para cada contêiner transportado na navegação doméstica há espaço para outros três serem captados. Hoje, eles estão sobretudo na rodovia, que responde por 60% da matriz de transporte, mas é considerada menos competitiva na longa distância. Os critérios utilizados para estabelecer as mercadorias que têm o perfil da cabotagem são: natureza da carga e distância entre os portos de origem e destino. "Minério ou grão transportados por rodovia não se encaixam dentro do nosso perfil. Em distâncias superiores a 1.500 km a cabotagem é o melhor. Entre 600 e 1.500 km existe competição com a ferrovia. E abaixo, o mais eficiente é o rodoviário."
Assim, o universo que poderia ter sido embarcado em navios no ano passado somou 1,5 milhão de Teus (contêineres de 20 pés), mas a indústria de navegação movimentou 348 mil Teus. Em outros termos, 1,1 milhão de Teus chegaram ou saíram dos portos de forma menos apropriada. A estimativa é que um caminhão emite até quatro vezes mais CO2 do que um navio para transportar uma tonelada em um quilômetro percorrido.
Uma das missões de Carvalho na Brasil Foods é encontrar soluções para reduzir ao máximo qualquer custo do transporte. Recentemente ele verificou que saía mais barato levar um carregamento de Brasília para Manaus (AM) descendo a carga até o porto de Santos (SP) e depois retornando de cabotagem para o Norte do que num trajeto direto de caminhão - apesar de este ser quase quatro vezes mais curto. A economia ficou entre 4% e 5%. "Qualquer um ou dois por cento de eficiência em logística acarreta uma economia enorme."
A Braskem, uma das maiores clientes de cabotagem de granéis líquidos, consegue ter redução de até 50% no custo do transporte entre o porto de Aratu (BA) e Santos usando a navegação doméstica ao invés de carretas. Em 2010, a cabotagem representou 6% de todo o tráfego da companhia, que chegou a 13 milhões de toneladas.
"É significativamente mais barato. Porém, a carreta é um ativo muito mais flexível que o navio", diz o gerente de logística de insumos básicos da empresa, Vinícius Patel. Além disso, ainda há o problema de infraestrutura portuária. No ano passado a Braskem enfrentou filas de espera de até 12 dias no porto de Santos. Em Aratu, é normal uma média de quatro dias, afirma Patel. "No Brasil é um ponto de atenção muito sério. Os portos nacionais já estão muito próximos da capacidade máxima."
Fonte:> Valor Econômico/Fernanda Pires | Para o Valor, de Santos
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