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Veneza tenta equilibrar efeitos da visita de navios de cruzeiro

Fonte de renda para a cidade italiana, turistas de diferentes partes do mundo trazem também poluição e impacto sobre ecossistema

Quando os navios de cruzeiros descem o Canal Giudecca para atracar no principal terminal de passageiros de Veneza, as vidraças de alguns dos palácios no cais tremem. Às vezes, até mesmo as paredes tremem.

"A gente acaba sentindo, mesmo se forem muito devagar", disse Rossella Vianello, que trabalha no departamento de linguística da Universidade de Veneza, que fica em um palácio de frente para o canal. As janelas tremem quando eles passam, ela disse, "embora fosse pior antes da universidade substituir o vidro velho por vidros duplos".

Além das janelas, um número crescente de venezianos está começando a questionar o impacto que esses grandes navios têm sobre esta cidade cronicamente frágil. No ano passado, 619 navios de passageiros e 581 balsas pararam na cidade – um destino imperdível nos itinerários de muitos cruzeiros Mediterrâneo – trazendo mais de 2 milhões de visitantes às ruas de Veneza, normalmente para estadas curtas.

A maioria dos navios segue o mesmo caminho até o terminal de passageiros, através do Bocca di Lido, o acesso norte à lagoa, e depois, ao longo da barriga em forma de peixe passando a Bacia de São Marcos e descendo o Canal Giudecca.

As preocupações são muitas e incluem questões sobre a poluição – água, ar e ruído – criadas pelos gigantescos navios, o impacto sobre o ecossistema da lagoa, bem como a possível erosão do mármore dos edifícios de Veneza e suas fundações submarinas.

"Não podemos mais aturar algo que afeta a saúde e o bem-estar da cidade. Temos de parar de fingir que nada está acontecendo", disse Saverio Pastor, um artesão local que fabrica peças para gôndolas e líder do movimento anti-cruzeiros, que realizou uma entrevista coletiva na semana passada. "Há a questão da visibilidade", acrescentou.

Por exemplo, o Olympia Palace, um barco que desceu o canal na semana passada, tem cerca de 215 metros de comprimento e 15 metros acima da água (com mais 24 metros abaixo). "É como um condomínio de 5 mil pessoas que passa por um ambiente extremamente delicado", disse Pastor.

Monitoramento

Oficiais responsáveis pelo porto têm repetidamente assegurado grupos de cidadãos que a região oeste de Veneza é constantemente monitorada em relação à qualidade do ar e emissões dos navios, bem como à poluição sonora e outros efeitos colaterais sobre a lagoa e seus prédios históricos. Mas críticos suspeitam de que eles não estão contando toda a verdade.

Pesquisas realizadas pelo porto indicam que as ondas criadas pela passagem dos navios "não causam qualquer dano aos edifícios e os níveis de poluição estão dentro da norma, mas os cidadãos percebem algo completamente diferente", disse Michela Scibilia, presidente da organização de moradores 40xVenezia. "Caso contrário, 400 pessoas não teriam entrado para o nosso grupo no Facebook em menos de uma semana”, disse ela. A cidade precisa, disse ela, "de um debate mais aberto”.

Alguns moradores que vivem na área próxima ao porto, perto da estação de Santa Marta, a mais próxima do terminal de passageiros, alegam que quando os barcos de cruzeiro e balsas passam, seus aparelhos de TV piscam devido à interferência eletromagnética dos navios.

Mas, gostem ou não, o turismo alimenta a economia de Veneza. "Todo mundo em Veneza trabalha com os passageiros de cruzeiros, dos táxis aos bares e fornecedores, é uma grande rotatividade", disse Antonio Murer, dono do El Chioschetto em Veneza, um bar no Canal Giudecca. Murer morava bem próximo ao seu bar e lembra que as fundações do seu prédio tremiam e copos tilintavam. "Mas os navios trazem pessoas e os cruzeiros podem salvar uma estação”.

Ainda assim, os moradores estão preocupados com a rapidez com que o fenômeno tem aumentado. Em 1999, menos de 100 mil pessoas visitaram Veneza como parte de um cruzeiro, enquanto no ano passado cerca de 1,6 milhões o fizeram. Hoje, Veneza e Barcelona disputam o primeiro lugar no ranking de porto mediterrâneo mais visitado.

"Em alguns dias você pode ver até 10 navios no porto. Isso não é seguro", disse Manuel Vecchina, outro crítico dos navios. E os turistas dos navios, que não ficam muito tempo, não fazem um impacto significativo na economia de Veneza. "E mesmo que eles gastem milhões, isso vale a pena o risco de destruir a cidade?", perguntou ele.

Protesto

No final de abril, vários grupos enviaram uma carta à Autoridade Portuária e a oficiais de Veneza pedindo que os navios de cruzeiro sejam proibidos de entrar na Bacia de São Marcos. Eles estão esperando por uma resposta. "Operamos dentro de todos os limites da lei e nos esforçamos para isso", disse Paolo Costa, presidente da Autoridade Portuária de Veneza, que rejeitou as críticas durante uma entrevista por telefone. "Nós temos o melhor terminal de cruzeiros do Mediterrâneo para a eficiência e sustentabilidade”.

Há trabalho em curso para a criação de um novo terminal em Fusina, no continente, junto à zona industrial do Porto Marghera. Quando ele abrir, em 2013, as balsas de passageiros (e os milhares de carros que transportam) serão desviadas para lá, usando uma rota através da lagoa que hoje é utilizada principalmente para o tráfego de carga. A autoridade portuária também está adotando medidas para melhorar a sustentabilidade ambiental e lidar melhor com o aumento no trânsito.

"Estamos diante de uma demanda sem limites por cruzeiros para Veneza", disse Costa. "Para os poucos milhares de manifestantes eu digo que milhões de visitantes vêm de cruzeiro e muitos milhões mais gostariam de vir”.

Muitos turistas defendem a experiência do cruzeiro. "Nós não teríamos chegado se não tivesse sido de cruzeiro", disse Rick Confer, um consultor financeiro de Minnesota no início de um cruzeiro de 10 dias pela Itália. "As pessoas querem ver cultura e beleza e os navios de cruzeiro permitem isso”.

Diga isso a Severino R. Rigo, um engenheiro de tecnologia da informação que representa uma comissão de moradores que vivem no bairro Castello de Veneza. Rigo está irritado porque muitos navios de grande porte podem atracar no largo do Riva dei Sette Martiri, um cais perto da Praça de São Marcos, trazendo poluição sonora e criando vibrações que ele acredita que são perigosas para as fundações dos prédios. "Tudo bem ter os turistas, mas eles têm de ser gerenciados", disse ele. "E ninguém poderia estacionar um trailer na Piazza Navona" de Roma.

Fonte: The New York Times/Elisabetta Povoledo






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