Uma nova poligonal para o porto de Manaus proposta pela Secretaria de Portos (SEP), órgão ligado ao Ministério dos Transportes, poderá ser instrumento para cobrança de taxa a embarcações. A medida pode onerar desde o abastecimento de alimentos no Estado até os insumos usados na Zona Franca de Manaus. A avaliação é do deputado Dermilson Chagas (PEN) que, nesta quinta-feira (30), manifestou-se contra o projeto do Governo Federal que, para ele, tem apenas o objetivo de arrecadação. O Porto de Manaus é administrado pela Companhia Docasdo Maranhão (CODOMAR), empresa de capital misto comandada pela União, que está no comando de todo o projeto que definirá as regras de acesso à cidade de Manaus.
O parlamentar participou de uma consulta pública na quinta-feira (23) da semana passada promovida pela Secretaria de Portos (SEP). Após pressão de pesquisadores em logística e transporte, de empresários e do próprio parlamentar, o representante da Secretaria de Portos, Luiz Estanes, admitiu que poderá rever a extensão da poligonal e aceitar a proposta da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), que prevê o trecho do rio na região mais próxima a orla de Manaus. Apesar da sinalização para recuar da proposta original, Estanes não deu garantia clara de que a medida será revista.
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Chagas fez críticas à forma como o processo está sendo feito. “A SEP pretende permitir à Codomar, por meio de concessão pública, a possibilidade de implementar, na prática, pedágio por cobrança de uso do canal de acesso a qualquer embarcação fluvial que se obrigue a trafegar pelo Rio Negro, de uma margem à outra, em frente de toda a cidade de Manaus, ou que venha a atracar em qualquer um dos seus portos privados”, destacou o parlamentar.
Em discurso na tribuna, Chagas disse ainda que a autoridade portuária não deu garantia que irá realizar os serviços referentes às cobranças. “O cenário é pior frente à revelação já confirmada pelo representante da CODOMAR, na audiência pública, de a companhia não deve realizar as contraprestações de serviços que justifiquem legalmente a tal cobrança, demonstrando o objetivo meramente arrecadatório da proposta. Assim, ressalto ser imprescindível que a intenção da autoridade portuária do Porto de Manaus e da SEP seja totalmente rejeitada por esta Assembleia Legislativa, vez que a cobrança de tarifa, ausentes as contrapartidas é considerada contrária ao que estabelecem a Lei Federal 12.815 de 2013 e a Resolução n? 3274, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários-ANTAQ, de fevereiro de 2014”, declarou Dermilson em discurso na ultima quinta-feira(30).
A audiência
Durante a audiência, Luiz Estanes justificou proposta inicial dizendo que não havia estudos sobre o canal do rio e que já esperava contestações. “Possivelmente será revista, nós não tínhamos estudos atualizados preliminares para essa área do rio. Não se preocupem que área da poligonal não vai ser essa grande.”.
Mas o representante da Secretaria de Portos foi contestado pelo comandante da Marinha e responsável pelo setor de segurança do tráfego aquaviário, Almir Ribeiro. “Nós temos tudo catalogado, está lá. A Marinha nunca foi chamada para fazer parte deste projeto. Manaus é centro de distribuição de tudo que vai para os municípios. Na hora em que qualquer embarcação entrar nessa área vai ter que pagar”, disse.
A advogada da empresa CODOMAR, Vanessa Vieira, disse ao fim da audiência que não haverá cobrança no que se refere à navegação interior, que inclui embarcações regionais, lanchas e balsas. Segundo ela, só grandes navios pagariam e apenas se todas as intervenções como dragagem e sinalizações forem feitas.
“A elaboração do canal de navegação é uma obrigação legal. Nós não fazemos balizamento e nem a manutenção, por isso não há cobrança hoje. A proposta tarifária que mandamos para ANTAQ é a isenção para todas essas as embarcações de passageiros, de pequeno porte e da navegação interior. Eventuais cobranças só seriam feitas em casos de navios que estejam fora dessas isenções, mas isso é para o futuro, nenhuma dessas empresas que estão na audiência não seriam cobradas”, disse.
Mesmo assim, empresários do setor não estão seguros da afirmação. O presidente da Associação dos Terminais Privados, Murilo Barbosa, afirma que em Belém, porto administrado também pela União, há cobrança de pedágio.
“Somos totalmente contrários à poligonal na área molhada. Isso poderia se restringir a área próxima ao porto. Nós temos que repensar essas considerações da Secretaria dos Portos. Dizer que não vai comprar é uma afirmação duvidosa. Lá em Belém eu tenho associados que foram cobrados porque cruzaram o canal para ter acesso ao seu porto privado e pagaram 90 centavos por tonelada durante anos e hoje estão na justiça. Isso não faz sentido. Estamos muito preocupados com essa revisão da área molhada do porto de Manaus”, disse Barbosa na audiência.
O estudo para a nova poligonal do porto organizado de Manaus foi feito pela Universidade Federal de Santa Catarina e tem 200 páginas, medida criticada por especialistas locais. “Nada contra a universidade de Santa Catarina, mas nem a UEA e creio que nem a Ufam foram ouvidas. Como eles fazem um projeto sem ouvir a inteligência local?”, disse o engenheiro e professor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Rubelmar de Azevedo Filho.
Legislação
A nova delimitação da área do porto consta do Diário Oficial da União (DOU) de 30 de março de 2006, documento assinado pelo então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento (PR), e pelo então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Na publicação, já havia as medidas para a nova área.
A Resolução n? 3274/14 da Antaq, no artigo 32, inciso XV, atribui infração às instalações portuárias que não pagarem tarifa devida pela utilização de infraestrutura portuária, prevista na Lei 12.815/13, também conhecida como a Lei dos Portos. Ainda de acordo com a lei, o canal de acesso faz parte dessa infraestrutura, porém, a mesma resolução, no artigo 33, inciso XXIV, alínea c, trata como infração também o fato de a autoridade portuária deixar de fazer manutenção no canal de acesso.
“A navegação interior em Manaus jamais precisou de qualquer tipo de melhoria em infraestrutura de acesso aquaviário - a exemplo de obras de dragagens - visto que a profundidade do Rio Negro sempre permitiu naturalmente a navegação em toda a extensão da poligonal pretendida pela autoridade portuária. Como, então, consentir à CODOMAR que justifique a cobrança de tarifa por obra de infraestrutura que jamais será exigida, sem que se configure verdadeira extorsão, vez que inexiste qualquer possibilidade de contraprestação de serviços no canal de acesso?”, questionou Chagas.
Fonte:acritica.com(Manaus (AM)/Com informações da assesoria