O mercado de navegação espera conseguir neste ano o que não foi possível em 2010: voltar aos níveis de frete do período pré-crise internacional. A principal aposta está no tráfego do Brasil com a Ásia - notadamente nas importações da China, a tábua de salvação de muitos armadores depois do rearranjo na economia mundial e da valorização do real frente ao dólar.
"A expectativa para 2011 na importação é excelente, voltando, definitivamente, aos níveis pré-crise de 2008. Contudo, estamos vendo o governo num movimento de alterar alíquotas de importação de diversos produtos, o que poderá afetar os embarques, principalmente a partir da China", diz o diretor da Iro-Log, empresa de logística e trading, André de Seixas.
Os valores de frete seguem a lei da procura e oferta e variam de armador para armador, de contrato para contrato. Apesar da recuperação dos volumes de cargas em praticamente todas as rotas com o Brasil - 22,5% acima de 2009 -, os preços ainda estão abaixo em comparação com 2008. Mesmo em relação a um ano atrás há defasagem. Hoje, trazer um contêiner de 40 pés de Xangai para Santos custa aproximadamente US$ 2,3 mil (já incluído o custo com combustível), quase 37% menos comparado a fevereiro de 2010.
Quando a crise explodiu, as companhias de navegação se viram obrigadas a reduzir seus preços para manter a participação do mercado. Mas fazer o caminho inverso quando a demanda por espaço aumenta é muito mais difícil. "O armador tem de focar no mercado como ele é e não como era num passado idealizado. Não há espaço para nostalgia", afirma David Lorimer, diretor da Datamar, consultoria especializada em comércio exterior marítimo. Talvez a comparação com 2008, considerado o melhor dos pouco mais de 50 anos do transporte mundial de contêineres, seja impiedosa.
"Hoje existem mais e muito maiores navios no tráfego", destaca Lorimer. Melhor para o usuário do transporte. Quanto maior a embarcação, o custo por unidade movimentada é mais diluído e tende a cair, explica o vice-presidente de operações do grupo CSAV da costa leste da América do Sul, David Giacomini.
No meio do ano passado os fretes chegaram bem próximos aos melhores níveis de 2008. Como as companhias estavam mais enxutas depois da crise - uma delas cortou o pessoal no Brasil de 500 para 200 funcionários -, conseguiram fechar 2010 com mais eficiência e resultado financeiro no azul. Mas desde agosto até o início deste mês os valores da Ásia para a costa leste da América Latina despencaram 47%, ante o pico de US$ 4.350 do contêiner de 40 pés - conforme levantamento feito a pedido Valor.
O declínio a partir dos últimos meses do ano é cíclico, pois as compras natalinas já foram feitas. A retomada dos volumes começa geralmente após o Carnaval. A consultoria francesa Alphaliner, por exemplo, atrela a diminuição também a um aumento de espaço nas rotas principais, com a entrega de embarcações recém-saídas dos estaleiros contratadas antes do estouro da crise. Muitas entrarão em serviços no tráfego Extremo Oriente-Norte da Europa, o mais movimentado e onde estão os maiores navios. Consequentemente, as linhas secundárias terão de absorver o excesso de capacidade. Só a Mediterranean Shipping Company (MSC) deve receber 15 porta-contêineres com capacidade entre 12,5 mil e 14 mil Teus neste ano.
"Ainda não sabemos como o mercado com a Ásia vai se comportar porque sem dúvida haverá oferta adicional de tonelagem", diz um alto executivo de uma companhia de navegação que prefere anonimato.
A grande expectativa agora são as compras para o dia das mães, que devem aquecer os motores do transporte no segundo trimestre. Da Ásia, vêm principalmente peças para fabricação de eletrodomésticos.
A participação do tráfego brasileiro com o Extremo Oriente e Sudeste Asiático tem aumentado ano a ano. Em 2009, representou 26,9% do total e no exercício passado, 29,8%, segundo dados da Datamar. Os números são puxados pelas compras brasileiras, visto que as exportações para lá têm caído. Esse desbalanceamento tem tornado os fretes dos porta-contêineres na exportação mais competitivos, e atraído cargas com menor valor agregado que tradicionalmente são embarcadas soltas no porão dos navios chamados breakbulk.
Em julho de 2010 o frete de um contêiner de 20 pés do Rio de Janeiro para Tianjin (China) estava em US$ 800. Neste mês, alguns agentes têm trabalhado na faixa de US$ 700. "A nossa trading está embarcando 120 mil toneladas por contêiner de sucata de aço, com valor agregado baixíssimo, pulverizando em diversos embarques ao longo de 14 meses", explica Seixas, da Iro-Log.
Como o contêiner carrega 26 toneladas, um frete a US$ 700 equivale a US$ 26,93 a tonelada. Para se ter uma ideia, no breakbulk, um navio de 40 mil toneladas, o frete está a US$ 48 a tonelada.
"Esses produtos têm um valor agregado muito baixo e qualquer dólar faz diferença, principalmente no ganho do exportador que, em detrimento do dólar baixo e das deficiências de infraestrutura de transportes do país, trabalha com uma margem mínima", diz Seixas.
A conteinerização é um processo que vem se acelerando ao longo dos anos e não apenas em razão dos valores fretes. A racionalização logística tem pesado a favor do contêiner. Por exemplo, a operação de carga e descarga independe das chuvas, que interrompem os embarques nos navios graneleiros. Além disso, cada vez os mercados estão mais pulverizados e o contêiner consegue ser o meio de entregar "frações do todo".
Fonte: Valor Econômico/Fernanda Pires | Para o Valor, de Santos
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